quinta-feira, 12 de agosto de 2010



Aprendo na fronte dele o que desaprendi compulsoriamente... 
O peito extenso, o coração em círculos e pensamentos em passos largos. 
Falo do comprimento da minha tão dolorida ferida , dos muitos golpes de punhais 
E tão pouco te peço...coisas tão pequenas... 
Há quem diga que não são ?! 
O amargo, a renúncia aparente , e todas as palavras de vidro , estilhaços de tudo! 
Devo engolir , deglutir , rasgar a garganta de formas múltiplas... 
Depois, expelir o vômito ocre das dúvidas deficientes que passeiam no estômago. 
Sabemos entre nós da fúria dos meus dias febris...do meu peso de mundo e do quanto me comprimi nos cantos dos teus olhos. 
Tateio e sangro enquanto insistes em emudecer meu gozo sonoro. 
Teus dedos tocam o fogo e vibram em cor de carne viva ... 
A substância da pele deixa de ser lucidez... vibro em tua língua na espessura das dores 
Lanço em tuas tripas um punhado de semivida , essa lama nas flores , as úmidas beiradas; 
Aponto para nuvens, construo passos e te percorro sem luvas... 
Tua anatomia , tua arquitetura ...gozo em te saber córneas cristalinas 
Mas devo dizer da ferida...que é dano irreparável ... 
Essa mania de viver depressa como se o mundo fosse semente sem terra 
É como ouvir um doce canto de sempre , de agora e não aceitar a existência do fim 
A inexistente continuidade nesta vida que arde agora 
É morte prematura enfim , essa brandura de alma , essa miséria de calma um tanto normal. 
Sou apenas eu, em nada teu igual ... 
Sou parte da tua magnificência, das súplicas nas tuas veias mansas , da íris prateada dos teus prazeres . Eu era intacta quando no útero do sentimento descansava.... agora sou fragmento de mundo , rotina surda que dança e pisoteia em chamas esta carta celeste, teu mapa ,nossas horas singulares ! Danço e respiro com notável avidez meu grande ato de confissão... estou à mostra para teu deleite , desentranhei a mulher de dentro , inspirei o sopro, o vento das tuas memórias transparentes. 
Não é rasa tua boca, nem é rouca tua voz ... 
Desaprendo a praticidade tarefa ; tu me ensinas alegria intensa de nós ... 
Somos três em cada um , e lutamos em vão , este descabimento ! 
Somos ouro, couro, diamante , matéria bruta...somos gruta !... 
Nossos beijos de montanha russa !... 
Se nos espAlhamos, somos loucura ; Se nos espElhamos somos altura 
Mas quando nos diluímos dois em seis , eu e você , todos nós ... 
Somos lucidez de perfeitíssimo entendimento. 






As cinzas do dia vieram deitar desassossegos em seu colo 
para que acariciasse o abismo em luto ao sonho falecido; 
Derramou dos olhos uma porção de sal ainda quente em latência 
enquanto calçava botas de aço como quem cumpre pena imposta 
por sua própria profundidade e descrença. 
Acorrentou o peito a uma tristeza impronunciável para que uma prece de silêncio 
lhe expurgasse a dor e lhe aliviasse o peso. 
Lembrou mais uma vez do quanto houvera sido imensa e do muito que pertencera 
repleta de raridade e amplitude nos dias em que a felicidade havia andado por eles. 
Encolhida no canto do quarto como criança que chora abandono, 
abraçou os joelhos com os braços num gesto desesperado de encontrar amparo e consolo... 
e novamente flagrou-se só .Recolhida em soluços numa melodia fúnebre e solitária. 
Banhou-se em escuridão e ofereceu os pulsos a lâminas de distâncias, mentiras e vazios... 
mas as mãos encontravam-se demasiado ocas para qualquer corte, ainda que lento. 
Correu para o abrigo dentro de si mesma e permitiu-se atear fogo nas sobras de utopias imperfeitas. 
Arremessou contra a parede tênue dos sentidos, os mosaicos que brilhavam lembranças 
nos mais variados tons de alegria. 
Gritou e esvaiu-se na dor dissimulada, desgrenhou os cabelos e pisoteou dúvidas afiadas 
que há tanto lhe retalhava os pés; Ao invés de aflição...deixou que sangrasse toda a fragilidade 
incômoda e delicadezas que não mais lhe serviam. 
Exprimiu um rubor infantil diante da memória de confissão , flagrante e obviedade cretina . 
Sentiu-se traída , subjugada , presa imaculada e indefesa de atroz crueldade e ignorância. 
Se atreveu a passear os dedos no sangue que se espalhava pelo chão de pedras frias 
para então levá-los a boca envenenando-se de vulnerabilidade. 
... 
Os olhos múltiplos arregalaram-se num frêmito de espera e véspera de morte 
E os lábios cansados sussurravam choro e enganos. 
Sentiu o alastrar da culpa e desalento pelas veias de descaminhos e descabimentos. 
O peito extenso de mágoas debateu-se em espasmos uma,duas e uma terceira,dessa vez mais forte 
e quase num golpe, expurgou pela boca uma espuma vermelha e abundante. 
O coração latejou e ouviu-se um grito, um urro , um pedido de clemência. 
Esta não era sua primeira morte e sabia que a noite líquida teria fim. 
Vomitou segredos e pousou finalmente os olhos , descansou os braços gélidos e desbotou o rosto. 
Ela, renasceria mais uma vez nua e sem pecados, fraquezas ou franquezas , 
pois aquele não era seu tempo. 
Lá fora a noite avançava , e os ouvidos cada dia mais surdos não desconfiariam de nada. 
Ironicamente, no céu não brilhava sequer uma única estrela ... 
Apenas uma revoada silenciosa de vaga-lumes que presenteavam a ilusão de um espaço infinito, 
em rotundo eco, anunciando uma incandescência nas horas que intuíam a promessa de um novo sorriso. 




Os dias passam despercebidos na tua presença 
Correm leopardos velozes carregando o tempo 
E assanham meus cabelos tuas mãos de vento 
roubando o perfume do abandono que outrora me deixaste 
Meus tornozelos acorrentados aos ponteiros do relógio 
insistem em prender-me por entre horas que não mais habitas 
Parte de mim se despede em ruínas 
E grávidas de ti estão minhas retinas 

Várias de mim irrompem de manhã à noite 
Provocam infinitas dores e gozos no desatino das guerras interiores 
Golpeio-me! bato de encontro ao muro de dentro num grito avassalador 
e me esfacelo, estilhaço, desfaleço... 
Não dou sossego as minhas infindáveis faces que percorrem o caminho branco das resmas, 
gozam de múltiplas formas e mancham com palavras os rostos torpes em mil fragmentos 
Os rostos que os questionamentos procuram recompor ; 
Eu sinto dor , ao morrer e renascer de cada dia ...arregalo os olhos, verto sangue, 
sangro as mãos, o ventre, o sexo, o nexo, anexo, desde o delicado princípio... 
E gozo essa matéria transparente,letrada, intermitente, a cada hora, a cada instante, 
demoradamente sobre vós. 
E de repente me vem essa vontade de não querer ser mais nada, de apenas respirar, transpirar, 
inspirar uns cantos de olhos silenciosamente ; .... 
Agora me sei simultaneidade, infinitude, e existência...pulsando e convergindo como quem tão 
consciente de sua multiplicidade se encontrou naquilo que sempre fora desde o início..... 
milhares e milhares ...em uma só entranha ! 


No fundo do poço que habita em mim, há sempre algo que quer ser arrancado. 
Palavras ou carpas cor de fogo, que se debatem nas águas como quem denuncia inquietude. 
Das antes, calmas nuances , agora turbulentas , emergem tentáculos de mistérios 
que perscrutam as paredes da alma diante dos rumores dos próprios desejos! 
Estes, que tantas vezes fingem sossegar, mas nos atormentam no exato momento 
em que mergulhamos para o rio interior, ou para lá somos lançados no desencadear de um gesto. 
Nadamos em busca de respostas diante do irreconciliável dilema. 
Existem razões ( ou seriam emoções ?! ) debaixo dessa tão aparente existência 
organizada, meticulosa, onde tecemos o tapete dos anos, horas, dias , segundos inescrutáveis ? 
Onde poucos de nós se arrisca no olho do furacão deixando-se por um momento flutuar numa 
onda de incerteza, que ao contrário das dúvidas febris, não incomoda, mas agita deliciosamente. 
Isso não significa deixar levar-se por um medo infundado, 
mas oferecer a si mesmo a oportunidade da mágica euforia que desentranha uns tesouros da carne 
e não se aquieta numa permanente e artificial espera. 
Espreitar pelas frestas das entrelinhas da vida me apetece muito mais à alma do que viver do razoável satisfatório. 
Não quero a carência de quem perambula sob escravidão cotidiana e silencia o crepitar das chamas 
na esperança de não arder ... prefiro os carvões em brasa , todos em meu colo, em minhas mãos , 
para que o meu coração se liberte! para que essa aparência de serenidade se descortine em êxtase 
e me ponha no peito um obstinado perfume de sol. 
Meus questionamentos são infinitos desvelos iluminando tudo ao meu redor! 
Muitos deles me cospem a face como sintomas de insanidade... 
Outros me acariciam os cabelos ou dançam nus sobre o fogo sem pressa de sentir a carne viva. 
São lucidez e loucura , razão e emoção ....universos tão incompatíveis onde um equilibra o outro 
e atravesso pontes de desafiadoras utopias numa terra de promessas. 
Onde a fome inadiável das indagações não encontra respostas que realmente satisfaça . 
Mas deseja liberdade e abrigo, segurança e delírio e somos náufragos de nós mesmos diante da inesperada vertigem.






A imprevisibilidade da noite desdenha a ordem superficial, 
o remanso da tarde e sua sensatez nuns olhares de esquinas. 
Sobre degraus insuspeitos tua voz amotina meu juízo e minha vontade. 
Tuas mãos despem meus pudores, me incita , me excita publicamente 
diante da fome atroz e urgente, me pega pela mão, pássaros úmidos de ansiedade, 
e me leva contigo por sobre os telhados. 
O que há em mim de felina pede teus dentes, teu poder, minha carne em tua boca, 
minha loucura em tua fúria, teus líquidos, meus fluídos,nossos segredos. 
Meu corpo sob tua medida ampla, de grandes ombros e abraços, 
não corre para não despertar o tempo, às elouqüentes do silêncio 
sussurrando salmos indecifráveis na ânsia de sossegar as línguas. 
São meus e teus, passos rápidos, desvios, rastros entre teus dedos, 
teus lábios impregnados pelo meu gosto e minha deliqüescência. 
Os minutos faiscantes estão à tona ,numa nova prenhez de inquietudes e presságios 
e se inauguram novos à inefável entrega, uma expectativa de olhos arregalados e cílios piscantes. 
Um passo ao infinito, a coxa enternecida, indecente refém voluntária do desejo 
na noite lânguida, ânsia e brasas, corredor e risco onde pressinto teu suspiro de animal rendido... 
e então já não basta saber provocações e vontades, saliva do beijo, cheiro do pescoço, 
calor das peles, suor quente, a textura dos teus relevos, a virilidade flagrante do teu desejo! 
Preciso-te em urgência e desespero, tuas pulsações e vertentes, do que rebenta e arrebata. 
Sugo teu gosto ácido, afago lascivo da língua, onde as possibilidades invadem fogo 
e derrubam o que encontram pela frente. ... 
Sou fêmea e ardências, minha vertigem dançando luminosa nos teus olhos estrelados... 
eu, invadida,intensa, impregnada dos teus líquidos...do nosso êxtase desmedido, 
que nos rompe e nos prova. ... 
Me atrevo a me deixar perder por completo e tu faz-se grande a ponto de perder-se em mim, 
afundar-me a carne latejante com teu desejo rijo e molhado da perdição da minha saliva, 
lambuzar-te vagarosamente, rapidamente, com fúria, impiedosamente entre minhas pernas,... 
pois do muito que me habitou nas noites de lembrar-te, de delinquescer nua, de lamber tua imagem, 
tramou-se o desconcertar das horas, o deliciar do instante que já se fazia em pensamento. 
perder-se !... perder o rumo o prumo e o norte , já que o mundo está demasiado longe agora 
e nada mais somos do que vontade, tesão, mundos colidindo, explosões múltiplas, 
um gozo sonoro, pulsante de estréia na ousadia do inédito, um frêmito que desembaraça por segundos, 
a espera...mergulhando fundo, inundando tudo, num instável trapézio de alívio 
e imediata fome que se refaz ainda maior. 
Não temos freios, temos partidas, não temos sossego, temos febres e ardores, 
um ninho vivo de flores escarlates e essência contagiante, compondo-se secretamente 
entre o enlaçar das pernas e teu sussurro ávido, morno, derramado em minha boca. 
Momento em que tu me olhavas como quem tenta decifrar um enigma à meia luz, 
momento tecido em fio claro, quase transparente, muito delicado, que eu terei costurado em meu avesso. ... 
Estar com você é rolar despenhadeiro abaixo, saltar em queda livre, um despencar de altura, 
um tremor de frio no centro do estômago... instante eternizado! 
...tua presença muda, absurda, concreta e absoluta... 
Fui feliz como são imensamente felizes aqueles para os quais basta saber-se ali, 
frente ao insondável mistério da completude, como são felizes os ignorantes,os ingênuos, 
as orquídeas. ... 
Sigo tendo em mim as digitais dos teus lábios, os pequenos passos dos teus dedos 
segurando meu rosto para deixar um beijo entre os últimos segundos que nos resta na noite. 
Tu sorris e é como se o impossível nos permeasse, como se o tempo soluçasse, 
como se a VIDA tropeçasse em nós e pedisse desculpas pelo inconveniente... 
porque teu sorriso é a confirmação e a negação absoluta de todas as minhas possibilidades... 
E o meu silêncio é o remanso que antecede a onda.