quinta-feira, 12 de agosto de 2010







As cinzas do dia vieram deitar desassossegos em seu colo 
para que acariciasse o abismo em luto ao sonho falecido; 
Derramou dos olhos uma porção de sal ainda quente em latência 
enquanto calçava botas de aço como quem cumpre pena imposta 
por sua própria profundidade e descrença. 
Acorrentou o peito a uma tristeza impronunciável para que uma prece de silêncio 
lhe expurgasse a dor e lhe aliviasse o peso. 
Lembrou mais uma vez do quanto houvera sido imensa e do muito que pertencera 
repleta de raridade e amplitude nos dias em que a felicidade havia andado por eles. 
Encolhida no canto do quarto como criança que chora abandono, 
abraçou os joelhos com os braços num gesto desesperado de encontrar amparo e consolo... 
e novamente flagrou-se só .Recolhida em soluços numa melodia fúnebre e solitária. 
Banhou-se em escuridão e ofereceu os pulsos a lâminas de distâncias, mentiras e vazios... 
mas as mãos encontravam-se demasiado ocas para qualquer corte, ainda que lento. 
Correu para o abrigo dentro de si mesma e permitiu-se atear fogo nas sobras de utopias imperfeitas. 
Arremessou contra a parede tênue dos sentidos, os mosaicos que brilhavam lembranças 
nos mais variados tons de alegria. 
Gritou e esvaiu-se na dor dissimulada, desgrenhou os cabelos e pisoteou dúvidas afiadas 
que há tanto lhe retalhava os pés; Ao invés de aflição...deixou que sangrasse toda a fragilidade 
incômoda e delicadezas que não mais lhe serviam. 
Exprimiu um rubor infantil diante da memória de confissão , flagrante e obviedade cretina . 
Sentiu-se traída , subjugada , presa imaculada e indefesa de atroz crueldade e ignorância. 
Se atreveu a passear os dedos no sangue que se espalhava pelo chão de pedras frias 
para então levá-los a boca envenenando-se de vulnerabilidade. 
... 
Os olhos múltiplos arregalaram-se num frêmito de espera e véspera de morte 
E os lábios cansados sussurravam choro e enganos. 
Sentiu o alastrar da culpa e desalento pelas veias de descaminhos e descabimentos. 
O peito extenso de mágoas debateu-se em espasmos uma,duas e uma terceira,dessa vez mais forte 
e quase num golpe, expurgou pela boca uma espuma vermelha e abundante. 
O coração latejou e ouviu-se um grito, um urro , um pedido de clemência. 
Esta não era sua primeira morte e sabia que a noite líquida teria fim. 
Vomitou segredos e pousou finalmente os olhos , descansou os braços gélidos e desbotou o rosto. 
Ela, renasceria mais uma vez nua e sem pecados, fraquezas ou franquezas , 
pois aquele não era seu tempo. 
Lá fora a noite avançava , e os ouvidos cada dia mais surdos não desconfiariam de nada. 
Ironicamente, no céu não brilhava sequer uma única estrela ... 
Apenas uma revoada silenciosa de vaga-lumes que presenteavam a ilusão de um espaço infinito, 
em rotundo eco, anunciando uma incandescência nas horas que intuíam a promessa de um novo sorriso. 

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